Do racismo à economia: parlamentares mulheres reforçam disputa entre governo e oposição no Facebook

Por: FGV ECMI 

 

Por: FGV ECMI 

 

  • Parlamentares de direita foram centrais, com Carla Zambelli e Bia Kicis obtendo quase o dobro de engajamento de Gleisi Hoffmann, nome que teve maior destaque no campo progressista. Tendência se repetiu no alcance das siglas partidárias, com o PL e PT em evidência;
  • Parlamentares de direita foram centrais, com Carla Zambelli e Bia Kicis obtendo quase o dobro de engajamento de Gleisi Hoffmann, nome que teve maior destaque no campo progressista. Tendência se repetiu no alcance das siglas partidárias, com o PL e PT em evidência;
  • Entre as temáticas acionadas pelas deputadas federais e senadoras, o debate sobre mulheres, povos indígenas, agronegócio, racismo e economia foram proeminentes;
  • As parlamentares de esquerda dominaram o debate sobre povos indígenas, racismo e economia, enquanto deputadas e senadoras da oposição disputam as discussões sobre mulheres, agronegócio, democracia e desinformação;
  • No debate temático, há um protagonismo de deputadas da base do PT, destacando tanto figuras historicamente conhecidas, como Gleisi Hoffmann, quanto novas parlamentares, como Carol Dartora.

 

O debate sobre mulheres, povos indígenas, agronegócio, racismo e economia foi destaque nas postagens das parlamentares eleitas durante o primeiro mês de mandato em 2023. O PL e PT, partidos com maiores bancadas no parlamento, foram as siglas com maior volume de engajamento e postagens, no entanto, parlamentares de direita demonstraram maior expressividade na plataforma, de modo geral. É o que mostra levantamento da Escola de Comunicação da FGV, que analisou 4.039 postagens de 85 deputadas federais e 10 senadoras entre os dias 1º e 28 de fevereiro. 

A análise dos temas de destaque no Facebook foi realizada por meio de uma técnica de modelagem de tópicos baseada em modelos linguísticos. Esse modelo extrai informações semânticas das palavras e agrupa em conceitos semelhantes, que são interpretados como temas. A representação de cada tópico é calculada utilizando um ranqueamento que leva em consideração a relevância de cada termo no grupo que pertence.

Em destaque, o debate sobre mulheres contou com intensa participação de parlamentares progressistas, embora figuras da direita tenham tentado disputar esta agenda, focando na imagem de Michelle Bolsonaro. Esta disputa também foi mapeada no debate sobre o agronegócio, com elogios ao MST, por um lado, e críticas a Lula, por outro, assim como nas discussões sobre democracia e desinformação, nas quais as noções de perseguição, censura e liberdade de expressão foram mobilizadas por ambos os campos. Nas discussões sobre racismo e povos indígenas, por sua vez, não foram observadas tentativas de disputa por parte do campo conservador, com forte protagonismo de parlamentares da esquerda. Deputadas e senadoras aliadas ao atual governo também protagonizaram o debate econômico, pautando o reajuste do salário mínimo.

 

Interações e engajamento por parlamentar no Facebook

 

Volume de interações e postagens por parlamentar no Facebook

Período: de 1° a 26 de fevereiro de 2023

gráfico de dispersão

Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

 

  • A atuação de parlamentares de direita alinhadas ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi proeminente em relação às demais deputadas federais e senadoras, com Carla Zambelli (PL-SP) e Bia Kicis (PL-DF) na dianteira do debate em termos de volume de interações;
  • Em número de publicações, se destacou a deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR), parlamentar do campo progressista que também tem maior volume de engajamento no Facebook. Jandira Feghali (PCdoB-RJ), Maria do Rosário (PT-RS) e Delegada Adriana Accorsi (PT-GO) também foram nomes de relevo da base governista;
  • Dois temas aparecem com recorrência entre as publicações de maior alcance de Zambelli e Kicis: a luta pela liberdade de expressão e o engajamento em torno de uma CPI relativa aos atentados de 8 de janeiro. No caso de Kicis, o apoio a Bolsonaro ainda é explicitamente acionado nas publicações, o que não ocorre na página de Zambelli, que opta por uma oposição direta a Lula, sem mencionar o ex-presidente;
  • As publicações de Gleisi Hoffmann trazem como enfoque o apoio sistemático a ações do governo Lula e, em menor grau, a responsabilização de Bolsonaro pela má situação do país, ao exemplo da crise humanitária dos Yanomamis. Jandira Feghali e Maria do Rosário optam por uma escolha retórica semelhante, mas mais diversa, ao exemplo de referências amistosas à primeira-dama Janja Silva. Ao evocar aspectos positivos do governo Lula, Hoffmann tende a centralizar temas referentes à economia.

 

Volume de interações e postagens por partido no Facebook

Período: de 1° a 26 de fevereiro de 2023

gráfico de dispersão

 

Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

 

  • A tendência de destaque de governo e oposição se repete em termos de siglas partidárias, com o Partido Liberal (PL) do ex-presidente Jair Bolsonaro e o Partido dos Trabalhadores (PT) do atual presidente Lula dominando o debate em alcance e números de publicações, respectivamente;
  • O destaque atribuído ao PL e ao PT se relaciona diretamente com o número significativo de parlamentares eleitas para cada sigla, enquanto partidos com menor impacto no debate elegeram um número consideravelmente menor de candidatas;
  • Em menor grau, mas com algum relevo na discussão, as parlamentares integradas aos partidos alinhados ao governo Avante e PSOL, ao de centro MDB e ao de centro-direita PP se destacaram no debate. A disposição das siglas sugere um cenário relativamente equilibrado entre governo e oposição, considerando o maior poder de alcance das parlamentares oposicionistas.

 

Temas de destaque no Facebook

 

Debate sobre Mulheres no Facebook

Período: de 1° a 26 de fevereiro de 2023

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Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

 

  • Proeminente em relação aos outros debates, a discussão sobre mulheres foi destaque entre as postagens de deputadas federais e senadoras no Facebook;
  • Embora parlamentares progressistas, como Gleisi Hoffmann (PT-PR), Benedita da Silva (PT-RJ) e Maria do Rosário (PT-RS), sejam mais atuantes neste debate, figuras conservadoras, como Bia Kicis (PL-DF) e Júlia Zanatta (PL-SC), mobilizaram um alto engajamento com publicações únicas;
  • Nesse sentido, a atuação de Michelle Bolsonaro como presidente do PL Mulher foi um episódio bastante citado pela direita, sobretudo em tom comemorativo. A ex-primeira-dama é enquadrada de modo bastante elogioso e positivo, enquanto uma mulher admirável;
  • Já o campo progressista se dividiu entre postagens que tratam do voto feminino e outras que celebram a relevância de Glória Maria para um jornalismo mais diverso. 

 

Debate sobre Povos Indígenas no Facebook

Período: de 1° a 26 de fevereiro de 2023

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Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

 

  • O debate sobre questões indígenas enfatizou a crise humanitária do povo Yanomami. Com protagonismo de parlamentares do campo progressista, especialmente do PT e do PSOL, a discussão se concentrou na divulgação de ações e de canais de ajuda para mitigar a crise, além da responsabilização do ex-presidente Bolsonaro e da senadora Damares Alves (Republicanos-DF) pela situação. Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Maria do Rosário (PT-RS), por exemplo, ressaltaram ações de combate ao garimpo ilegal no atual governo, especialmente a atuação de instituições como o Ibama e Funai;
  • A posse de Joenia Wapichana (Rede-RR) como presidenta da Funai também teve repercussão relevante no período, sendo abordada por Hoffmann e Erika Kokay (PT-DF) como um ato simbólico diante da crise humanitária em andamento;
  • Lateralmente, parlamentares de centro e centro-direita também tiveram relevância na discussão. Foram registradas publicações de apoio aos Yanomami por parte de parlamentares atuantes na região Norte, como as deputadas Renilce Nicodemos (MDB-PA), Elcione Barbalho (MDB-PA) e Socorro Neri (PP-AC), além da senadora Professora Dorinha (União-TO);
  • A temática indígena não foi abordada ou não teve alcance significativo em publicações de parlamentares de outros espectros políticos.

 

Debate sobre Agronegócio no Facebook

Período: de 1° a 26 de fevereiro de 2023

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Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

 

  • Publicações que enaltecem ações do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a narrativa de que o governo Lula estaria agindo sistematicamente contra o agronegócio marcaram o debate polarizado sobre o setor; 
  • O argumento de que o presidente Lula estaria “boicotando” o agronegócio foi endossado em publicações da deputada federal Carol De Toni (PL-SC). Júlia Zanatta (PL-SC) também avaliou que Lula estaria prejudicando a economia do país ao “vilanizar” o setor. A ex-ministra da Agricultura do governo Bolsonaro e atual senadora, Tereza Cristina (PP-MS) também teve relevância no debate, mas com um posicionamento mais comedido e sem se opor diretamente às ações do atual governo; 
  • O campo progressista, por sua vez, obteve maior alcance ao associar o MST a diferentes frentes defendidas por membros do atual governo, ao exemplo do combate à fome e ao trabalho análogo à escravidão. Deputadas como Ana Paula Lima (PT-PR), Gleisi Hoffmann e Natália Bonavides (PT-RN) tiveram alcance relevante ao ressaltar aspectos positivos do movimento social.

 

Debate sobre Racismo no Facebook

Período: de 1° a 26 de fevereiro de 2023

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Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

 

 

  • Tema que, pautado por deputadas progressistas, se dividiu entre publicações que denunciam diferentes casos de racismo e outras que destacam políticas de inclusão racial;
  • Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Daiana Santos (PCdoB- RS) se destacaram por meio de denúncias, seja em caráter mais geral, pautando o racismo estrutural, seja acionando um teor mais pessoal, explicitando violências sofridas pelas próprias deputadas. O caso envolvendo trabalho análogo à escravidão em vinícolas do Rio Grande do Sul (RS) também foi abordado, estabelecendo associações entre o atual momento e o período da escravidão no Brasil; 
  • Por outro lado, a entrada de Anielle Franco e Silvio Almeida na equipe ministerial do governo Lula foi comemorada por parlamentares como Carol Dartora (PT-PR). A deputada, assim como Dandara Tonantzin (PT-MG), também celebrou a proposta de criação de uma Frente Parlamentar de Combate ao Racismo e Promoção da Educação para as Relações Étnico-raciais e de Gênero na Câmara dos Deputados;
  • Não foi mapeada a atuação de parlamentares de centro ou de direita neste debate, o que pode indicar um afastamento entre este campo político e a agenda racial. 

 

Debate sobre Economia no Facebook

Período: de 1° a 26 de fevereiro de 2023

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Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

 

 

  • O reajuste do salário mínimo pelo governo Lula ganhou destaque no debate econômico. Pautada, principalmente por parlamentares aliadas da base do PT, como Hoffmann (PT-PR), Maria do Rosário (PT-RS) e Benedita (PT-RJ), a discussão se vinculou a uma série de elogios ao presidente, ancorados na ideia de que Lula cumpre com suas promessas de campanha; 
  • Por outro lado, o compromisso do presidente com o aumento do salário mínimo foi questionado pela deputada da base de oposição, Clarissa Tércio (PP-PE). Atuando de modo bastante lateral, Tércio compartilhou um vídeo que indica que Lula teria irritado trabalhadores ao não cumprir com a promessa de aumentar o salário mínimo. A deputada ainda indica, em tom crítico, que o governo teria “outras prioridades” econômicas.

 

Debate sobre Democracia no Facebook

Período: de 1° a 26 de fevereiro de 2023

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Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

 

  • A noção de democracia aparece de modo tensionado neste debate, que conta com o protagonismo de figuras como Bia Kicis (PL-DF) e Jandira Feghali (PCdoB-RJ). Nesse sentido, ambos os campos políticos se acusam reciprocamente de ameaçar a democracia;
  • Bia Kicis, por exemplo, reforça sua estreita associação com o ex-presidente Jair Bolsonaro ao se concentrar em postagens críticas a Lula. A parlamentar afirma que a democracia estaria em risco e que o presidente estaria atentando contra a liberdade dos seus opositores. Já a deputada Jandira Feghali vai contra esta perspectiva, afirmando que votou em Lula para defender a democracia brasileira, que estaria ameaçada por Bolsonaro; 
  • A necessidade de diálogo e de poder popular também foram aspectos reforçados nesta discussão, sobretudo por parlamentares do campo progressista, como Luiza Erundina (PSOL-SP), Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Denise Pessôa (PT-RS);
  • O protagonismo isolado de Bia Kicis neste debate pode indicar que, ainda que parte da direita dissemine narrativas de perseguição e censura, estas perspectivas não ganham tanto destaque no Facebook, quando comparadas às postagens de parlamentares da esquerda. 

 

Debate sobre Clima no Facebook

Período: de 1° a 26 de fevereiro de 2023

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Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

 

  • No debate sobre clima, as parlamentares se destacaram por abordar temas relacionados à emergência climática, pauta impulsionada pelo recente desastre no litoral paulista. Deputadas federais do campo progressista ficaram em evidência, mas houve a participação de deputadas de centro ou centro-direita;
  • Nota-se uma forte ênfase no debate sobre mudanças climáticas, o que explica a própria ocorrência, isolada e repetida, de certos termos, na medida em que estes foram extremamente relevantes em tais posts. Maria do Rosário (PT-RS), por exemplo, abordou a estiagem no Rio Grande do Sul, com destaque para a parceria com o governo federal. Já Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Talíria Petrone (PSOL-RJ) debatem o tema com enfoque nas enchentes e altas temperaturas da capital, enquanto Camila Jara (PT-MS) chamou a atenção para as áreas de deslizamento no Mato Grosso do Sul. Assim como as demais deputadas, Luíza Erundina (PSOL - SP) reforçou a permanente relevância da pauta no cenário atual;
  • Deputadas de partidos mais próximos ao centro e à direita também entraram no debate. Socorro Neri (PP-AC) comentou a proposta de seu gabinete pela criação de uma Frente Parlamentar Mista em Defesa da Transição Climática Justa. Já Geovânia de Sá (PSDB-SC) propôs reflexões a partir do desastre, chamando o público à ação e prestando solidariedade às vítimas;
  • Em menção mais restrita ao caso do litoral paulista, Luciene Cavalcante (PSOL-SP) lamenta o ocorrido e deseja solidariedade às vítimas. Ela também destaca que o gabinete tem trabalhado no tema.

 

Debate sobre Desinformação no Facebook

Período: de 1° a 26 de fevereiro de 2023

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Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

 

  • O tema é majoritariamente acionado a partir de uma disputa em torno da regulação das mídias sociais, aquecida a partir da recente movimentação do Ministério da Justiça em torno da pauta e das declarações de autoridades do governo em fórum da Unesco. Parlamentares governistas e oposicionistas levantam pontos antagônicos em relação ao tema e obtêm alcance semelhante;
  • Deputadas como Carla Zambelli, Júlia Zanatta, Carol De Toni e Adriana Ventura endossam o coro de que a abordagem do governo faria parte de um projeto de enfraquecimento da democracia. O argumento central é de que a regulação seria um mecanismo autoritário de silenciamento de opositores políticos, especialmente da extrema-direita. Há menção também aos riscos que seriam representados pelo retorno do PL das Fake News (2.630/2020) nessa seara;
  • Por outro lado, deputadas alinhadas ao governo atual, ao exemplo de Jandira Feghali e Juliana Cardoso, argumentam que a regulação das redes sociais poderia auxiliar no combate à desinformação, limitando as decisões privadas das plataformas digitais no âmbito do debate público.