Deputadas de oposição são cobradas por voto contra PL da igualdade salarial e classificam medida como “populismo” do governo
Por: FGV ECMI
Por: FGV ECMI
- Os grupos favoráveis à medida dominaram o debate em 80%, entre celebrações pela aprovação e críticas aos parlamentares, especialmente as mulheres, que votaram contra;
- Para justificar votos contrários, oposição argumentou que a igualdade salarial entre homens e mulheres já estaria na CLT e que lei prejudicaria empresas e trabalhadoras;
- Ausência de partidos que foram contra a medida e teor reativo de parlamentares da oposição em relação a críticas recebidas foram características dominantes no debate.
A discussão em torno do PL 1.085/2023, chamada de Igualdade Salarial, que foi aprovada no dia 04 de maio na Câmara dos Deputados, mobilizou campos políticos divergentes a partir de motivações distintas: enquanto a oposição optou por uma postura defensiva ou por não comentar os votos contrários à medida, o conjunto de parlamentares que contribuíram para aprovar o projeto de lei celebraram o feito e criticaram os oposicionistas como sendo contra os direitos das mulheres. É o que mostra o levantamento da Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV, que analisou 66.700 postagens sobre o tema no Twitter e 520 no Facebook, entre 04 e 08 de maio de 2023.
A argumentação da oposição se concentrou em classificar a medida como “oportunismo populista”, além de uma suposta imposição de obstáculos para a contratação de mulheres. Parte dos votantes contrários, no entanto, optou por não se manifestar sobre as críticas. Na base governista, oscilou-se entre a celebração pela aprovação da medida e as críticas aos parlamentares que votaram contra a proposta, em especial as mulheres, que tenderam a ser mais hostilizadas. Também nesses perfis, ainda foi recorrente o argumento de que tanto o “bolsonarismo” quanto o “lavajatismo” seriam posicionamentos contra as conquistas sociais das mulheres.
Debate geral sobre o PL 1.085/2023
Mapa de interações sobre o PL 1.085/2023 no Twitter
Período: de 04 a 08 de maio
Quantidade de tuítes: 66.700

Fonte: Twitter | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV
A identificação de 10 clusters principais aponta para uma significativa pulverização da discussão em torno do Projeto. Em conformidade com a metodologia de análise de redes, tal segmentação se dá em termos de interações entre os perfis e não necessariamente remete a divergências em relação a temas e argumentações. Em realidade, a ampla maioria dos conjuntos de perfis se posicionaram a favor do Projeto de Lei de Igualdade Salarial, enquanto o conjunto de oposição alinhado ao ex-presidente Jair Bolsonaro ficou isolado ao enfatizar as críticas à proposta (no grafo, em azul). Nesse sentido, os 9 grupos relativamente favoráveis ao Projeto aparecem interligados entre si, como indicado pelo grafo acima representado, e apresentam temas e linhas argumentativas semelhantes, mas que tenderam a apresentar diferentes nuances, como buscamos detalhar abaixo.
Cluster Laranja - 15,2% de perfis | 14,9% de interações
O grupo com maior número de interações e perfis foi centrado em torno do influenciador progressista @lazarorosa25. Logo após a votação em Plenário, o usuário divulgou a lista de deputados que votaram contra o Projeto, com posterior ênfase aos nomes e fotos das deputadas mulheres que não foram a favor do projeto de lei. As várias interações em torno dos tuítes mobilizaram comentários indignados com os votos das parlamentares, acusadas, por exemplo, de “burrice” e de serem “bolsonaristas”.
Cluster Azul - 9,7% de perfis | 7,7% das interações
Isolado em relação aos grupos, o conjunto foi formado majoritariamente por atores políticos vinculados à direita bolsonarista. Deputados federais, como @BolsonaroSP, @andrefernm e @Zambelli2210, justificaram seus votos contrários à proposição ao afirmarem que a igualdade salarial já estaria prevista na CLT. O ex-presidente da Fundação Cultural Palmares, @camargodireita, compartilhou das mesmas preocupações ao comparar o caso com possíveis propostas futuras de igualdade salarial entre pessoas pretas e brancas.
Cluster Vermelho - 9,6% de perfis | 10,6% das interações
O grupo reuniu as autoridades do governo federal, que se engajaram em comemorações pela aprovação do Projeto como uma vitória e conquista do governo Lula em prol da igualdade de gênero. Além de @lulaoficial, perfil central do cluster, aparecem em destaque nomes como @randolfeap, @pimenta13br, @simonetebetbr e @marinasilva, além de perfis oficiais dos próprios ministérios.
Cluster Amarelo escuro - 9,1% de perfis | 10,2% das interações
Caracterizado pela centralidade de parlamentares e partidos de esquerda, o conjunto também enfatizou a comemoração pela aprovação do Projeto. A aprovação na Câmara dos Deputados foi avaliada como uma vitória por perfis como @esuplicy, @dasilvabenedita e @mariadorosario. Dando sequência à maior ênfase ao Legislativo, os perfis partidários @psol50 e @ptbrasil destacaram a atuação de suas bancadas. A exposição dos votos contrários teve destaque secundário.
Cluster Amarelo - 8,8% de perfis | 9,7% das interações
Perfis progressistas apócrifos, influenciadores e veículos midiáticos de esquerda se articularam a partir da divulgação dos nomes das deputadas que rejeitaram o Projeto. Foi o caso de perfis como @tesoureiros, @eumarinamamede e @revistaforum. No desdobramento da discussão, nomes como Carla Zambelli (PL-SP) e Rosângela Moro (UNIÃO-PR) são acusados de prejudicarem suas próprias eleitoras, o que gerou discussão, entre a esquerda, quanto ao posicionamento do eleitorado feminino de direita. Em tom de ironia, sugeriu-se que as deputadas também recebessem salários menores.
Cluster Lilás - 8,5% de perfis | 10,5% das interações
A indignação quanto ao voto de parlamentares mulheres contra o Projeto é o tema central de grupo formado por influenciadoras e ativistas mulheres que se declararam vinculadas ao progressismo e ao feminismo. O principal perfil do conjunto é a jornalista @cynaramenezes, mas nomes como a blogueira @lolaescreva e a deputada federal @camilajarams também compuseram o debate. O posicionamento das deputadas foi classificado como “incompreensível”, “inexplicável” e “inacreditável”. De maneira lateral, independentemente do gênero dos votantes, o bolsonarismo e o lavajatismo foram evocados como sendo posicionamentos políticos que são contra a equidade salarial entre homens e mulheres.
Cluster Vinho - 8% de perfis | 7,5% das interações
O grupo reuniu perfis de personalidades e ativistas homens vinculados ao campo político progressista. Ativistas, como @RonnyCombate, e intelectuais, a exemplo de @emirsader, também se engajaram em chamar a atenção para as parlamentares mulheres que votaram contra o PL 1.085/2023. O ator @TucaAndrada3 liderou em engajamento com tuíte que chamou as parlamentares de “fofinhas q vontaram contra a igualdade salarial”, parabenizando, ironicamente, “eleitoras desse lixo”. Tuítes com links de notícias de veículos midiáticos como @OTempo também tiveram ressonância no debate, com o mesmo enfoque sobre mulheres terem votado contra a proposta.
Cluster Roxo - 7,6% de perfis | 8% das interações
Ainda em relação ao voto contrário de parlamentares mulheres, conjunto diversificado de perfis progressistas se reuniram em torno da afirmação de que Carla Zambelli, Bia Kicis e Rosângela Moro deveriam passar a receber menos do que seus colegas homens após o voto. Avaliações negativas à fala de Michelle Bolsonaro sobre a cota partidária para mulheres e críticas às eleitoras das “deputadas bolsonaristas” também apareceram. Os perfis @PedroRonchi2 e @hospicio_brasil foram os principais vetores da discussão.
Cluster Verde - 4,3% de perfis | 4,1% das interações
Veículos e influenciadores de esquerda tiveram destaque com críticas aos votos de mulheres contra o Projeto e ao fato de serem “bolsonaristas” e “lavajatistas”. Destacou-se que o Partido Liberal, encabeçado pelo “misógino” - em possível referência ao ex-presidente Jair Bolsonaro - somou 26 dos 36 votos totais contrários à proposta. Perfis como @PlantaoBrasilOF, @SergioAJBarret e @Gattiaosta1 tiveram centralidade.
Cluster Rosa - 4,2% de perfis | 3,3% das interações
Páginas de entretenimento e política tiveram amplo alcance com notícias sobre a aprovação do Projeto. Tendeu-se a associar a figura de Lula à decisão do Congresso. @choquei, @siteptbr e @eixopolitico foram perfis centrais neste grupo.
Cluster Magenta - 4,1% de perfis | 3,9% das interações
Parlamentares e influenciadores progressistas, além de atores do governo, tiveram destaque e focaram na celebração da aprovação do Projeto - em especial @guilhermeboulos, @padilhando e @simonetebetbr. De maneira isolada dos demais usuários citados, chamou a atenção o perfil satírico @GloboFakeNews, que, sob a descrição “a verdade será revelada através da fake news”, produz posts com notícias falsas de viés irônico. Neste cluster, ele contribuiu para disseminar a informação de que Dallagnol teria votado contrário ao Projeto “em nome de Deus”.
Principais links sobre o PL 1.085/2023 no Facebook
Período: de 04 a 08 de maio
Quantidade de publicações: 367

Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV
- A exposição de parlamentares que votaram contrariamente ao Projeto de Lei também foi o maior destaque entre os links mobilizados no debate público sobre a pauta, com especial ênfase às parlamentares mulheres. O nome das deputadas contrárias ao projeto é destaque mesmo entre veículos tradicionais, como UOL, O Globo e Correio Braziliense;
- Páginas de esquerda, como CUT e Pragmatismo Político, assumiram particular protagonismo. Em particular, texto duplamente publicado em Revista Fórum e Socialista Morena critica as parlamentares que votaram contra o Projeto de Lei e convoca à perda de apoio eleitoral. Nesses termos, questiona-se como uma mulher poderia deixar de defender a desigualdade salarial. Rechaça-se, também, o argumento de que a igualdade já estaria estabelecida sem o Projeto;
- Há maior divisão entre o tema nos comentários das publicações. Nesses termos, enquanto favoráveis comemoram a aprovação e elogiam o governo, críticos afirmam que o Projeto é demagogia, já que tal prerrogativa já existiria na CLT. Este argumento, bem como a perspectiva de que mais imposições prejudicariam as contratações de mulheres, aparecem entre as falas das deputadas, replicadas em reportagem do UOL.
Debate parlamentar sobre o PL 1.085/2023
Engajamento médio dos parlamentares no debate sobre o PL 1.085/2023 no Facebook
Período: de 04 a 08 de maio
Quantidade de publicações: 153

Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV
- À exceção de Carla Zambelli (PL-SP), que concentrou uma quantidade importante de interações ao justificar seu voto contrário ao PL da Igualdade Salarial, o debate foi tocado majoritariamente pela base governista, que celebrou a aprovação da medida e teceu críticas aos votantes contrários à mesma;
- Carla Zambelli obteve ampla ressonância no debate ao se defender de críticas sobre ter votado contra o PL da Igualdade Salarial. Em consonância com outros correligionários, Zambelli justificou que a igualdade salarial existe em lei desde 1943 e que o projeto seria uma “manobra populista” do governo;
- Zambelli ainda afirmou que o projeto de lei aprovado abriria margem para uma suposta “imposição de ideologização das contratações” de empresas privadas. O posicionamento da parlamentar se deve ao componente da lei que propõe dar visibilidade a outras desigualdades no ambiente profissional, como raça, etnia, nacionalidade e idade;
- Em termos de conteúdo, as parlamentares governistas oscilaram entre a celebração pela aprovação do Projeto e a exposição dos deputados que foram contra a medida. Um dos posts de maior alcance de Sâmia Bonfim (PSOL-SP), por exemplo, expunha as fotos, os nomes e os partidos dos votantes contrários à medida. Gleisi Hoffmann (PT-PR), por sua vez, concentrou as críticas à Zambelli e Dallagnol, enquanto Ivan Valente (PSOL-SP) mirou na ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, sugerindo que ela teria influência sobre votos contrários à PL;
- No Centro, foram registrados posicionamentos divergentes. Enquanto Rosângela Moro (UNIÃO-PR) investiu no argumento de que o Projeto seria um instrumento populista do governo, a Delegada Ione celebrou a aprovação. Rosangela ressaltou que a igualdade salarial já estaria prevista e que a nova medida prejudicaria os contratadores e, consequentemente, a contratação de mulheres, uma vez que implicaria, supostamente, em multas indevidas e na exposição do salário das mulheres.
Engajamento por partido em postagens sobre o PL 1.085/2023 no Facebook
Período: de 04 a 08 de maio

Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV
- Sendo o único representante da oposição a fazer postagens sobre o projeto de lei, o Projeto teve o maior engajamento total e engajamento médio por deputado no debate no Facebook. Apesar de liderar em engajamento, parlamentares do partido fizeram um número pequeno de postagens, especialmente diante do tamanho de sua bancada, que é a maior da casa legislativa;
- A base aliada ao governo se mobilizou na plataforma pela aprovação do projeto de lei, enviado para o Congresso pelo governo Lula. Enquanto o PT foi o partido que teve o maior volume de postagens e de engajamento total, a REDE e o PSOL lideraram no engajamento por deputado.
Votação na PL 1.085/2023 por partido na Câmara dos Deputados
Período: de 04 a 08 de maio

Fonte: Facebook | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV
- Observando o resultado da votação do projeto de lei de acordo com cada partido, é possível notar que o PL, protagonista do debate nas plataformas digitais, foi o terceiro partido com maior porcentagem de votos contrários ao Projeto, com 24% de votos “não”. O partido também teve o maior número de votos contrários em números absolutos, com 24 negativas. O partido com recusa mais expressivo foi o NOVO, que votou de forma homogênea, com três votos contra o projeto. O partido, no entanto, não teve uma participação significativa no debate digital;
- Entre os partidos da base do governo, é possível notar aderência total à recomendação partidária, em consonância com a presença dos parlamentares desses partidos no debate nas plataformas digitais;
- Desse modo, é possível observar que, enquanto a defesa do projeto nas redes sociais se deu entre a base governista em acordo com a votação na Câmara dos Deputados, nos partidos de oposição a mobilização contra o projeto de lei se deu de maneira mais tímida, sendo restrita aos parlamentares que foram pressionados e questionados com relação ao voto.