Violência contra indígenas, garimpo ilegal e polarização política seguem repercutindo no debate sobre a crise Yanomami

Por:FGV ECMI

Por: FGV ECMI

 

  • Apesar da crise humanitária persistir durante o ano, o maior pico de menções ao tema continua sendo em janeiro de 2023;
  • Se em 2023 o ex-presidente Bolsonaro era mencionado como principal responsável pela crise, em 2024 críticos culpam a gestão de Lula por ainda não ter resolvido a situação;
  • O desfile da Salgueiro homenageando os povos Yanomami ampliou publicações sobre a cultura e as tradições do norte do país, em especial menções aos povos indígenas.

O debate sobre a crise humanitária Yanomami continua em alta no início de 2024, mas o pico de menções relacionadas ao tema continua sendo em janeiro de 2023. É o que mostra estudo da FGV Comunicação Rio, que analisou a repercussão deste tema no X, Facebook e Instagram, considerando um período mais amplo, de janeiro de 2023 a dezembro de 2024, com ênfase na comparação entre o mês de janeiro dos dois anos.

O relatório mostra que conteúdos sobre violência contra indígenas e garimpo ilegal são destaque, conforme já apontando em relatório de 2023 que acompanhou o debate sobre a crise Yanomami. No entanto, a responsabilização de Bolsonaro ou de Lula ainda são os principais catalisadores do debate. O estudo também analisa a repercussão do desfile da Salgueiro no carnaval do Rio de Janeiro, que homenageou os povos Yanomami.

 

Crise Yanomami: os cenários de 2023 e de 2024

 

Evolução do debate sobre os Yanomami no X

Período: 1º de janeiro de 2023 a 31 de janeiro de 2024 

 

gráfico de evolução

 

Fonte: X | Elaboração: FGV ECMI

 

  • A crise Yanomami do início de 2023 foi o maior destaque do período, concentrando críticas e responsabilizações à gestão Bolsonaro (PL), sobretudo no campo progressista. Disputando essa atribuição de responsabilidade, os grupos de direita culpam gestões anteriores de Lula (PT), mas em menor volume. Ainda em janeiro, foram mapeadas críticas ao garimpo, motivadas por uma reportagem exibida no Fantástico; 
  • Em 2024, as discussões giram em torno da oposição ao atual governo Lula, acusando-o de não tomar atitudes significantes em relação aos povos Yanomami. O aumento no número de desnutridos, dos casos de malária,  entre outros problemas de saúde ressoam pela rede, sobretudo entre perfis conservadores. Enquanto isso, perfis conectados ao governo apontam para a redução no número de garimpeiros no território;
  • Para além da crise sanitária que ainda persiste entre os Yanomami, tópico de maior destaque no debate, o ataque a indígenas do povo Pataxó Hã-hã-hãe (BA) também ressoou na rede. Nesse tópico, alguns apoiadores do governo Lula apontam o ataque como consequência do garimpo ilegal, ao passo que os seus opositores destacam o aumento  do extrativismo ilegal e possível descaso do presidente Lula e do governador Jerônimo Rodrigues (PT).

 

Principais termos sobre os Yanomami no X



Período 1: janeiro de 2023 

nuvem de palavras



Período 2: janeiro de 2024

nuvem de palavras

 

Fonte: X | Elaboração: FGV ECMI 

 

  • Em 2023, as críticas ao governo Bolsonaro tomaram as discussões dentro da rede. A oposição ao governo Bolsonaro denunciou atores da antiga gestão, apontando nomes como Damares Alves (Republicanos-DF) e Ricardo Salles (PL-SP), além do próprio ex-presidente. Em 2024, por sua vez, as críticas predominantes são da oposição ao governo Lula, pontuando que a gestão atual  não está conseguindo lidar com a crise humanitária dos Yanomami assim como o avanço do garimpo em áreas indígenas;
  • No ano anterior, o povo Yanomami teve destaque isoladamente na rede. Em 2024, contudo, outras comunidades indígenas chegam ao debate. Sobre a população Pataxó Hã-hã-hãe é salientado o episódio de violência contra alguns de seus líderes. A oposição pauta o debate de forma mais perceptível, apesar de uma intensa presença de progressistas;
  • A institucionalização do debate indígena é ponto de interesse, com dois eixos de debate: o da defesa à atual gestão, pontuando a importância da criação do Ministério dos Povo Indígenas, ao passo que perfis de oposição que  questionam a efetividade da instituição;
  • O garimpo é um dos tópicos que permaneceu em evidência em ambos os momentos. Contudo, se em 2023, salientava-se as consequências da atividade mineradora na área, o foco das discussões em 2024 são os avanços do governo Lula na luta contra o extrativismo;
  • Com relação ao governo federal, se destacam menções a uma suposta inação do exército brasileiro no combate ao garimpo em 2024. Essas menções, no entanto, não repercutem na mesma extensão que os episódios de violência.

 

Principais atores no debate de 2024



Principais páginas e perfis no debate sobre o tema no Facebook 

Período: janeiro de 2024 |  1.564 posts

 

gráfico de barras

Fonte: Facebook  | Elaboração: FGV ECMI

 

 

  • Os maiores picos de posts estavam relacionados a momentos nos quais o governo Lula anunciava programas de combate ao garimpo nos territórios Yanomami, ou alguma forma de ajuda humanitária. O maior destaque, nesse sentido, é o plano do governo federal contra as invasões de garimpeiros no território, com orçamento de 1,2 bilhão; 
  • Seguindo essa tendência, a discussão foi pautada principalmente por veículos da mídia tradicional. Destacando-se os portais de notícia do grupo Globo e o portal UOL. Na mídia, o debate está relacionado à volta do garimpo nas terras Yanomami e à crise sanitária que ainda persiste na região, além de tratar  das ações do governo federal para mitigar a situação;
  • Atores políticos de esquerda e direita tiveram participação dividida nos debates. Na oposição destacam-se os perfis de Paulo Eduardo Martins (PL-PR), Damares Alves, e o Coronel Telhada (PP-SP), cujo tom das postagens era acusatório, apontando o descaso do atual governo com o povo Yanomami. A ministra Marina Silva e o perfil oficial do PT são os destaques na base governista, anunciando os avanços do atual governo em relação a população Yanomami;
  • Entre a mídia independente, apenas perfis progressistas obtiveram engajamento considerável, prevalecendo um tom mais informativo e destacando a reunião ministerial feita pelo atual governo para discutir a crise sanitária. A possibilidade da instauração de uma investigação contra Jair Bolsonaro pelo que é chamado de  "genocído do povo Yanomami" também repercutiu. Em um tom mais descontraído, o último realce é a escola de samba Salgueiro que levará para o Sambódromo Marquês de Sapucaí termos e frases do povo Yanomami neste carnaval.

 

Principais páginas e perfis no debate sobre o tema no Instagram

Período: janeiro de 2024 |  826 posts 

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Fonte: Instagram | Elaboração: FGV ECMI

 

  • Os picos das postagens estão relacionados a reportagens mostrando poucos avanços na situação do povo Yanomami, assim como as medidas lançadas pelo governo federal para remediar a crise e falhas nas ações do governo federal. Outro ponto de destaque foi a morte de 99 crianças yanomamis em 2022 em decorrência dos impactos do garimpo ilegal;
  • O debate entre lideranças políticas segue presente, assim como observado no Facebook.  Aqui,  Carla Zambelli (PL-SP), Bia Kicis (PL-DF), Hélio Lopes (PL-RJ),  Damares Alves e o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ) se destacam tecendo críticas ao governo Lula. Os parlamentares dão ênfase às mudanças nos modelos estatísticos na contagem de indígenas mortos por desidratação e indicam que a atual gestão utilizou o tema para atacar o ex-presidente Bolsonaro; 
  • Na mídia tradicional, a Folha de São Paulo destaca críticas ao Ministério dos Povos Indígenas e à presença de garimpos ilegais no território. A mídia de direita, representada pelos perfis Gazeta do Povo e Conexão Política Brasil, críticam o governo destacando a persistência da crise e os poucos avanços em relação a fiscalização na Amazônia;
  • No campo progressista perfis como o Chavoso da USP, com críticas ao sistema capitalista e ao garimpo ilegal, e a conta oficial do presidente Lula, realçando os planos do governo para impedir o avanço do extrativismo ilegal na Amazônia, são os destaques. 

 

Monitor parlamentar



Atuação parlamentar no debate sobre o tema no Facebook

Período: janeiro de 2024 |  30 posts 

 

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Fonte: Facebook  | Elaboração: FGV ECMI

 

  • No começo de janeiro de 2024 o tema foi mais comentado pelos parlamentares, contudo as interações tiveram maior volume  no final do mês. Comparando com o mesmo mês em 2023, houve uma diminuição de 85,5% no número de posts, e de 74,6% de parlamentares que tratam sobre o tema. 
  • Assim como em 2023, o PT mobilizou mais discussões sobre a crise indígena, contudo a direita também conseguiu centralidade, principalmente considerando perfis como o de Carla Zambelli que obteve maior destaque, em termos de interações. O PL, mesmo não publicando mais posts, obteve maior volume de  interações. O Republicanos, principalmente através da figura da senadora Damares Alves, conseguiu, também, uma boa repercussão na rede;
  • Damares Alves é o destaque com mais posts, mas foi Carla Zambelli que obteve o maior número de interações. De modo geral, parlamentares de direita, principalmente aliados do ex-presidente Bolsonaro, são os destaques na rede em engajamento e número de publicações; 
  • Contudo os apoiadores do governo também disputam  espaço na rede, com destaque para Rogério Correia (PT-MG) que teve o maior número de postagens entre parlamentares governistas.  Gleisi Hoffmann (PT-PR) foi a parlamentares da base do governo que acumulou mais interações. Já o senador Humberto Costa (PT-PE), que postou o maior número de vezes em 2023, fez apenas uma publicação em  2024 sobre o tópico.

 

Principais argumentos no debate sobre o tema no Facebook

Período: janeiro de 2024    

prints de notícias

 

Fonte: Facebook  | Elaboração: FGV ECMI

 

  • Além da senadora Damares Alves e a deputada Carla Zambelli, Flávio Bolsonaro (PL-SP) e o Coronel Telhada são outros nomes importantes. Os posts acumulam críticas ao governo Lula em relação à persistência da crise humanitária no território Yanomami. Procuram afastar as críticas feitas por grupos ambientalistas e opositores, principalmente em 2023, a Bolsonaro argumentando que a situação do povo Yanomami deteriorou-se na atual gestão; 
  • A ministra Nísia Trindade também foi alvo pelo caso de violência sexual que ocorreu em uma unidade regional do Ministério da Saúde. Argumentam como o discurso de Lula e seus apoiadores, no começo de 2023, utilizaram a pauta indígena como palanque político, para atacar a antiga gestão, destacando o aumento do número de queimadas na Amazônia e no cerrado brasileiro. Procuram, ainda, deslocar o termo 'genocida' de Bolsonaro para Lula;
  • Disputando a narrativa, Gleisi Hoffmann, Humberto Costa e Randolfe Rodrigues (Sem partido - AP) são os parlamentares governistas com mais interações. Ressaltando os planos da atual gestão Lula em unir várias frentes para uma atuação conjunta de reforço ao combate ao garimpo ilegal, a saúde pública e garantir a proteção dos povos yanomami, com o aporte de R$ 1,2 bilhão para a proteção da Terra Indígena Yanomami, eles reafirman que a crise humanitária na região é importante para a atual gestão, além de redirecionarem a culpa para Bolsonaro e Damares. O caso da comunidade Pataxó Hã-hã-hãe (BA) é destacado pelo deputado Padre João (PT-MG);
  • O garimpo tem destaque nas redes dos parlamentares da oposição, ressaltando o avanço no número de invasões ilegais. Perfis váriados ressaltam a importância das Forças Armadas intensificarem as ações contra o extrativismo ilegal, além das ações de garimpeiros contra fiscais do IBAMA e aviões da FAB.

 

Debate sobre Yanomamis no carnaval 



Principais posts sobre o debate indígena relacionado ao carnaval no Facebook e Instagram

Período: 11 a 14 de fevereiro de 2024 |  351 posts 

 

print de posts no facebook

 

Fonte: Facebook e Instagram | Elaboração: FGV ECMI

 

  • Destaque para as postagens dos perfis Índios do Brasil e Loucos pelo Garantido, que conquistaram o maior número de interações devido ao destaque dos Yanomami no desfile. Já no Instagram, os perfis da cantora Rebecca e Mídia Ninja protagonizam o debate. A presença dos perfis de conteúdo regional dentre os mais relevantes, como os primeiros, mostra um movimento atípico provocado pelo enredo com destaque indígena no carnaval.
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Destaque multiplataforma sobre o debate indígena relacionado 

ao carnaval


Período: 11 a 14 de fevereiro de 2024

 

destaques