Perfis alinhados à direita dominam discussão sobre pautas conservadoras com folga

Por: FGV ECMI

 

Por: FGV ECMI

 

  • Entre os debates sobre aborto, drogas e “saidinhas”, perspectiva de oposição ao governo registrou protagonismo especialmente no X e no Facebook . No Instagram, debate tendeu a um maior equilíbrio; 
  • No recorte parlamentar, o protagonismo da direita é ainda mais marcado do que no debate mais amplo, com distância notória em termos de engajamento em relação aos demais campos políticos; 
  •  A discussão sobre as “saidinhas” foi o tema de maior volume desde o início do ano, com forte campanha para extinguir o benefício a detentos. Mortes de policiais foram utilizadas como argumentos-chave. 

Pautas caras à agenda político-partidária da oposição foram debatidas proeminentemente sob a ótica de atores alinhados a este campo, com protagonismo de parlamentares de oposição e baixa reação de perfis da ala progressista. Entre as discussões sobre aborto, drogas e “saidinhas”, apenas a questão dos entorpecentes registrou um equilíbrio mais notório entre as perspectivas divergentes sobre a pauta. É o que mostra o estudo da FGV Comunicação Rio, que analisou postagens no X, no Facebook e no Instagram, entre 1º de janeiro e 23 de abril de 2024. No debate parlamentar, a distância entre os campos no debate público foi ainda mais discrepante, com amplo protagonismo de nomes da direita alinhados ao ex-presidente Jair Bolsonaro.

Evolução do debate sobre pautas conservadoras no X

Período: de 1º de janeiro a 23 de abril de 2024

imagem

Fonte: X | Elaboração: FGV ECMI 

O debate sobre as “saidinhas” de detentos foi o mais volumoso entre os temas observados no X. Com 327.150 menções desde 1º de janeiro, o tópico registrou 478% a mais de postagens do que a PEC das Drogas (56.600) e 472% a mais do que a questão do aborto (57.150). As “saidinhas” também motivaram um maior número de picos expressivos no debate político, sendo pautadas independentemente da ocorrência de ações parlamentares sobre o tema. Foi registrado ainda um forte protagonismo de perfis de direita no âmbito deste debate, o que ressalta a centralidade do tema na agenda político-partidária de oposição ao governo. Enquanto a tendência de atores centrais de direita se repetiu no debate sobre o aborto, a discussão sobre a PEC das Drogas registrou um cenário mais equilibrado, com destaque para perfis progressistas de perspectiva antiproibicionista. 

No debate a respeito das “saidinhas”, o maior pico, no dia 7 de janeiro, foi motivado pelo assassinato de um sargento da PM por um detento que estava em saída temporária, em Belo Horizonte. A discussão do fim desse benefício na Câmara dos Deputados respondeu pelos picos seguintes. No caso da PEC das Drogas, a aprovação da medida no âmbito do Senado, no dia 16 de abril, foi o auge do debate, enquanto a questão do aborto teve uma alta isolada no dia 29 de fevereiro, com a repercussão da informação errônea de que o governo teria legalizado a prática de maneira generalizada a partir de nota técnica emitida pelo Ministério da Saúde. 

Engajamento médio de parlamentares no debate sobre pautas conservadoras no Facebook1 

Período: de 1º de janeiro a 23 de abril de 2024 

imagem

Fonte: Facebook | Elaboração: FGV ECMI 

Em termos de engajamento médio, parlamentares da oposição se destacam em todos os temas analisados. No caso das “saidinhas”, a oposição tem 78,4% de engajamento, enquanto o engajamento dos deputados e senadores governistas representam 7,09% do engajamento total sobre o tema. Os deputados Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Carla Zambelli (PL-SP) são os destaques da oposição, enquanto Rogério Correia (PT-MG) e Gleisi Hoffmann (PT-PR) concentram o maior volume de interações na base do governo. No debate sobre a PEC das Drogas, a oposição concentra uma fatia ainda maior das interações, com 82,33% do engajamento, enquanto a base do governo tem 5,91%. Na oposição, Carla Zambelli e Marcel Van Hattem protagonizam o debate em termos de engajamento, enquanto Sâmia Bomfim (PSOL-SP) e Chico Alencar (PSOL-RJ) se destacam na base do governo.

No debate sobre o aborto, a oposição tem seu pior desempenho, com 63,63% do engajamento. Nesse grupo se destacam os deputados Eduardo Bolsonaro e Gustavo Gayer (PL-GO). No entanto, a base do governo permanece com 7,38%, tendo como parlamentares com mais engajamento a deputada Sâmia Bomfim e o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ). O centro também tem desempenho expressivo nesse debate, com 28,97% do engajamento relacionado ao tema. Nesse campo, se destacam os deputados Coronel Telhada (PP-SP) e Maurício Neves (PP-SP). 

As postagens relacionam os temas em tom de denúncia, convocando a população a se mobilizar “na defesa de Deus, Pátria, Família e Liberdade”. Nesse sentido, o aspecto religioso e patriota é mais fortemente mobilizado, especialmente no debate sobre o aborto e a PEC das Drogas. Já os parlamentares da base do governo se concentram em postagens de caráter informativo e na defesa das ações do governo.

Nuvem de termos sobre o debate das “saidinhas” no X

Período: de 20 de março a 23 de abril de 2024

imagem

Fonte: X | Elaboração: FGV ECMI 

Há um claro predomínio da direita alinhada a Bolsonaro no debate sobre as “saidinhas”, predominando a noção de que o governo e, principalmente, Lula agem com leniência em relação à criminalidade. O veto do presidente a um trecho do Projeto de Lei foi acionado como evidência de que Lula se importa mais com criminosos do que com as “vítimas da violência” – narrativa que fez com que o veto repercutisse mais do que o fato do PL ter sido sancionado. 

Nesse escopo, a oposição envolveu nomes de relevo, como Jair Bolsonaro, Carla Zambelli e Sergio Moro, e incentivou uma mobilização de perfis comuns a partir de hashtags, como #derrubaovetocongresso, mas o mesmo envolvimento não foi mapeado entre o campo progressista, tornando o debate pouco disputado. 

Desde a votação do PL, em março, o campo progressista só conseguiu destaque ao relacionar esse debate a Chiquinho Brazão, indicando uma suposta incoerência por parte dos parlamentares de direita que defenderam o fim das “saidinhas”, mas votaram contra a prisão do investigado. Com exceção do deputado Rogério Correia, esta discussão, vale dizer, foi protagonizada por perfis comuns. 

Principais postagens no Facebook e Instagram sobre o tema 

Período: de 20 de março a 23 de abril de 2024 

imagem

 

Total de postagens no Facebook: 5.805 | Total de postagens no Instagram: 1.957

Fonte: Facebook e Instagram | Elaboração: FGV ECMI 

O protagonismo da oposição se mantém no Facebook e no Instagram. No Facebook, por exemplo, das 20 publicações com maior volume de interações, apenas duas não vieram de atores políticos ou veículos de mídia alinhados à direita. No Instagram, há ainda um fenômeno interessante de participação de algumas páginas que, embora sejam mais voltadas ao entretenimento, se alinharam ao argumento da direita. 

Nuvem de termos sobre a PEC das Drogas.

Período: de 13 de março a 23 de abril de 2024 

imagem

Fonte: X | Elaboração: FGV ECMI 

O debate sobre a PEC das Drogas tendeu ao equilíbrio, com destaque tanto para atores de direita quanto progressistas. Parlamentares e grupos organizados contra a criminalização das drogas, como a Marcha da Maconha São Paulo, encabeçam a discussão na ala progressista, mobilizando o argumento central de que a definição aberta de quem seria usuário ou traficante poderia prejudicar mais diretamente pessoas pretas e pobres. Reflexões sobre possíveis proposições de tratamentos alternativos ao vício de drogas, ao invés de encarceramento, foram levantadas por esses atores. 

Entre perfis de direita, atores políticos, como os senadores Damares Alves (Republicanos-DF) e Flávio Bolsonaro (PL-RJ), foram as vozes mais proeminentes. Ressalta-se o ineditismo atribuído à decisão e o fato de se tratar de uma alegada “vitória histórica” para o campo político supracitado. Com críticas ao Judiciário, o também senador Eduardo Girão (Novo-CE) ressaltou que o próximo passo para garantir a criminalização ampla de drogas seria “barrar o ativismo do STF” na pauta em questão. 

Principais postagens no Facebook e Instagram sobre o tema 

Período: de 13 de março a 23 de abril de 2024 

Total de postagens no Facebook: 6.371 | Total de postagens no Instagram: 2.494

imagem

Fonte: Facebook e Instagram | Elaboração: FGV ECMI 

De forma semelhante ao observado no X, o debate sobre a PEC das Drogas no Facebook e no Instagram registrou um relativo equilíbrio entre os campos em disputa. É relevante pontuar que parlamentares da oposição que capitanearam a PEC das Drogas ou a apoiaram tiveram amplo destaque, em especial de parlamentares de oposição. Veículos hiperpartidários de direita, como Jornal da Cidade Online, também foram vetores importantes para emplacar a ideia de que a decisão do Senado teria sido uma vitória contra o crime organizado. 

Na ala progressista, mais do que parlamentares, veículos de mídia deste segmento, como a Mídia Ninja, estiveram em evidência ao repercutir o caso como um “retrocesso histórico”. Movimentos sociais e influenciadores antirrarcista também obtiveram expressivo alcance com este argumento, a exemplo do grupo Anistia Internacional Brasil. É importante ressaltar que essa perspectiva teve especial destaque no Instagram, constituindo a postagem com o maior número de interações no âmbito deste debate na rede. 

Debate sobre o aborto 

Nuvem de termos sobre o aborto 

imagem

Período: de 29 de fevereiro a 23 de abril de 2024 

Fonte: X | Elaboração: FGV ECMI 

O debate recente sobre o aborto foi impulsionado por uma nota técnica emitida pelo Ministério da Saúde, no fim de fevereiro, que removia o limite temporal nos casos autorizados pela atual legislação, como estupro. O texto, que foi suspenso pela ministra Nísia Trindade após a repercussão negativa, desencadeou uma onda de postagens que afirmavam que Lula teria autorizado o aborto a qualquer momento da gestação e sob qualquer circustância. 

Mensagens de forte teor religioso e denúncias de suposto estelionato eleitoral por parte do presidente deram corpo a parte expressiva desse debate. É relevante pontuar que o fato foi amplamente deturpado na medida em que muitas mensagens alardeaveam que o governo teria autorizado o aborto de modo generalizado às escondidas, promovendo, portanto, o “assassinato de bebês no ventre”. 

Veículos hiperpartidários de direita e atores políticos, como o vereador paulistano Rubinho Nunes, tiveram alta visibilidade no debate. Perfis alinhados à base progressista não registraram participação relevante na discussão em termos de alcance. 

Principais postagens no Facebook e Instagram sobre o tema 

Período: de 29 de fevereiro a 23 de abril de 2024 

Total de postagens no Facebook: 1.283 | Total de postagens no Instagram: 907 

Fonte: Facebook | Elaboração: FGV ECMI 

No Facebook, há um predomínio de uma posição contra o aborto, que é endossada por deputados federais da oposição como Carla Zambelli e Eduardo Bolsonaro, além de páginas de cunho religioso. Já no Instagram, foi observado um equilíbrio maior entre as perspectivas, com destaque para atores progressistas favoráveis ao aborto. Nesse campo, sobressaíram-se as deputadas federais Erika Hilton e Samia Bomfim, que obtiveram amplo alcance em postagens sobre PLs e resoluções que visavam garantir o aborto legal para vítimas de estupro.