A batalha pela educação: Uma análise do termo 'doutrinação' na nova Frente Parlamentar da Câmara dos Deputados.

Por: DRI 

Por: DRI 

 

 

  • Proteger as crianças e conceder mais autoridade aos pais sobre a educação de seus filhos motivou um grupo conservador de parlamentares a criar uma Frente Parlamentar em Defesa da Educação sem Doutrinação Ideológica. Na visão deles, os professores são a principal fonte de disseminação da "doutrinação ideológica" nas escolas; 
  • Políticos alinhados à direita no Brasil popularizaram o termo 'doutrinação ideológica' para abranger vários movimentos, políticas ou esforços que eles se opõem, especialmente aqueles associados a ideologias de esquerda, seculares e pró-LGBTQIA+; 
  • Políticos preocupados com a 'doutrinação' geralmente fazem acusações contra comportamentos específicos que não estão alinhados com suas preferências políticas. Além disso, eles promovem o comportamento como representativo de uma agenda ideológica mais ampla. Em sua comunicação online, o termo 'doutrinação' não apenas é enganoso, mas também está ligado a teorias conspiratórias prevalentes; 
  • Dois temas principais predominaram: alegações de doutrinação político-ideológica de esquerda e "ideologia de gênero". Dentro desses tópicos, identificamos postagens retratando (1) o atual governo de Lula como trabalhando para criar uma distopia comunista enquanto engana a juventude e (2) organizações transnacionais e grupos de direitos LGBTQIA+ minando os valores tradicionais da família cristã. Essas narrativas explicam o tom urgente e indignado observado em muitas postagens dos deputados signatários. 

No dia 10 de outubro de 2023, um grupo de deputados e deputadas federais lançou a Frente Parlamentar em Defesa da Educação sem Doutrinação Ideológica (FPDEDI). O Partido Liberal (PL) liderou o processo, com o deputado Gustavo Gayer (PL-GO) como presidente da Frente. Ao analisar a comunicação online dos parlamentares ,para observar a motivação por trás da criação dessa Frente, e sua compreensão sobre o termo ‘doutrinação’, observamos os seguintes temas principais: (i) a proteção das crianças e a autoridade dos pais sobre a educação dos filhos são motivadores-chave para a Frente; (ii) o conceito de doutrinação é usado para abranger vários temas, principalmente a oposição a ideias de esquerda, rotulando-as como uma tentativa de instalar o comunismo no Brasil e impor a "ideologia de gênero" às crianças. Ao longo dessa análise, os autores encontraram desinformação e teorias conspiratórias documentadas. Esta análise foi realizada pela  Democracy Reporting International.    

Metodologia

Este relatório examina a retórica da 'doutrinação ideológica' no discurso político online brasileiro, entendendo o perfil dos deputados(as) signatários(as) da Frente em Defesa da Educação sem Doutrinação Ideológica (FPDEDI) na Câmara dos Deputados do Brasil. Primeiramente, analisamos o estatuto da Frente e o discurso de inauguração para entender sua motivação fundadora, bem como os tópicos e atores associados à 'doutrinação'. Em seguida, utilizando dados de postagens do Instagram dos perfis dos parlamentares que assinaram o pedido de criação da Frente Parlamentar, aprofundamos como os membros discutem a doutrinação online, analisando os tópicos que são associados a esse conceito. 

Para compreender a motivação por trás do estabelecimento da Frente, analisamos o estatuto fundador da Frente e uma transcrição do discurso do congressista líder na cerimônia de inauguração. Para entender o conceito de 'doutrinação' e os temas associados a ele, conforme definido pela Frente, coletamos dados do Instagram entre 1º de fevereiro de 2023 (primeiro dia do mandato dos deputados) e 11 de outubro de 2023 (um dia após a cerimônia de inauguração da Frente). Filtramos o conjunto de dados, que consistia em um total de 51.055 postagens iniciais, em subconjuntos menores usando um filtro. O filtro foi construído com base em um dicionário de palavras-chave, como (1) palavras relacionadas à doutrinação citadas diretamente no Estatuto da Frente e no discurso mencionado; e (2) termos relacionados ao ecossistema educacional em geral. No geral, analisamos dois subconjuntos de maneiras quantitativas e qualitativas, totalizando 7.055 postagens. 

Para a análise quantitativa, utilizamos três métodos principais para interpretar as postagens: (i) modelagem de tópicos, uma técnica que nos permite relacionar palavras encontradas em comentários do Instagram à sua probabilidade de associação com tópicos mais amplos; e (ii) frequência de palavras, ou contagem da ocorrência de uma palavra em um conjunto de dados específico. 

Este relatório possui três seções: (I) "A Frente Parlamentar em Defesa da Educação sem Doutrinação Ideológica", que explica o papel que a Frente possui na Câmara dos Deputados do Brasil e analisa o Estatuto da Frente; (II) "Quem assinou: Perfil dos Deputados Signatários da Frente Parlamentar", que analisa o perfil dos deputados e seus partidos, juntamente com a motivação por trás da criação da Frente, considerando seus discursos durante a cerimônia de inauguração; e (III) "O que é dito: Compreendendo a Doutrinação por Meio de Tópicos Comuns Encontrados nas Postagens do Instagram dos Signatários", que explora os tópicos e temas associados à doutrinação com base em sua comunicação online, no conteúdo encontrado em cada tópico e nos adjetivos mais frequentes usados pelos políticos. 

 

  1. A Frente Parlamentar em Defesa da Educação sem Doutrinação Ideológica 

 

  • Dentro da Câmara dos Deputados do Brasil, existem várias Frentes Parlamentares. As Frentes são associações de parlamentares de diferentes partidos políticos que se reúnem para discutir tópicos específicos de interesse para a sociedade. Elas podem ser compostas apenas por deputados ou mistas, incluindo tanto deputados quanto senadores. Para ser estabelecida, uma frente parlamentar deve apresentar um pedido que inclua as assinaturas de pelo menos um terço dos membros do Poder Legislativo (deputados e senadores) - no caso do Brasil, isso se refere a um mínimo de 198 assinaturas. 
  • Após coletar 203 assinaturas (183 de congressistas e 20 de senadores), em 10 de outubro de 2023, um grupo de deputados lançou a Frente Parlamentar em Defesa da Educação sem Doutrinação Ideológica (FPDEDI). O grupo é presidido pelos deputados Gustavo Gayer (PL-GO) e Nikolas Ferreira (PL-MG) e coordenado pelo deputado Luciano Zucco (Republicanos-RS). 
  • Entre os objetivos apresentados no Estatuto da Frente Parlamentar em Defesa da Educação sem Doutrinação Ideológica (FPDEDI), os seguintes são relevantes: a) conscientizar pais, educadores, alunos e sociedade civil sobre a ocorrência de doutrinação ideológica nas escolas; b) monitorar e supervisionar programas e políticas educacionais dentro das escolas; c) combater e prevenir a doutrinação político-ideológica nas escolas; d) facilitar debates sobre doutrinação nas escolas para fortalecer as famílias; e) restaurar a soberania dos pais na educação de seus filhos e aproximá-los dos ambientes educacionais para que tenham pleno conhecimento do conteúdo ensinado nas salas de aula e autoridade para questionar, aprovar ou desaprovar o currículo e os métodos de ensino. 
  • Somado a isso, o estatuto da FPDEDI define a frente como opositora à "doutrinação ideológica", "doutrinação político-ideológica" e "lavagem cerebral esquerdista-marxista" no sistema educacional do Brasil. O estatuto não define esses termos, nem especifica qual currículo os deputados consideram como doutrinação ideológica. 
  1. Quem Autorizou: Perfil dos Deputados Signatários da Frente Parlamentar 
  • Neste relatório, focamos apenas nos 183 congressistas que assinaram o pedido. Analisamos os perfis dos deputados signatários para entender a motivação deles para criar a Frente. O gráfico abaixo acompanha os signatários de acordo com o gênero e alinhamento a uma frente religiosa  

Gráfico 1: Perfil dos Deputados Signatários

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Fonte: Câmara dos Deputados | Elaboração: Democracy Reporting International 

 

  • Dos 183 signatários, 155 são homens e 28 são mulheres. Os legisladores do sexo masculino na Frente (85%) podem refletir um viés de gênero contra a "doutrinação ideológica política" ou refletir a atual disparidade de gênero na Câmara dos Deputados (17% mulheres). 

 

  • Existem dois grupos religiosos afiliados: a Frente Parlamentar Evangélica do Congresso Nacional e a Frente Parlamentar Católica Apostólica Romana. Dos 183 congressistas analisados, apenas 24 não fazem parte de nenhum dos grupos religiosos (87% fazem parte). As filiações religiosas e de gênero combinadas dos congressistas signatários correlacionam-se com crenças socialmente conservadoras, ajudando a investigar possíveis influências religiosas na compreensão dos temas associados à "doutrinação" neste contexto. No Brasil, diferentes estudos destacam o impacto das políticas públicas democráticas sob atores políticos religiosos pertencentes a movimentos conservadores. 
  • O Gráfico 2 retrata o alinhamento partidário dos signatários da Frente.  

 

Gráfico 2: Partidos dos Deputados Signatários

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Fonte: Câmara dos Deputados | Elaboração: Democracy Reporting International 

 

  • O Partido Liberal (PL) tem o maior número de deputados signatários líderes. Dos 183, 86 pertencem ao partido do ex-presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, principal oposição ao governo atual e o partido com mais assentos na Câmara dos Deputados (99 de 513). O líder da Frente Parlamentar, Gustavo Gayer, é filiado ao PL. O partido lidera uma agenda mais conservadora na Câmara dos Deputados e, como visto em um relatório anterior, o partido também lidera em número de projetos de lei com conteúdo anti-trans, tendo uma agenda mais tradicional e baseada em questões religiosas. 

 

  • Os outros quatro partidos com o maior número de deputados signatários são União (UNIÃO), Partido Progressista (PP), Republicanos e Movimento Democrático Brasileiro (MDB), cada um com agendas em oposição ao governo atual. Essa mobilização conservadora e a criação desta frente parlamentar são amplamente vistas como resultado das eleições de 2022, que elegeram deputados com perfil conservador para a Câmara dos Deputados. 

A Motivação por trás da Frente em Defesa da Educação sem Doutrinação Ideológica (FPDEDI) 

 

  • Para identificar temas principais e entender melhor o conceito de 'doutrinação' pelos deputados, analisamos a cerimônia de inauguração da Frente na Câmara dos Deputados do Brasil e observamos como eles discutem diferentes atores, seus objetivos com a Frente e a motivação por trás de sua criação. 
  • O gráfico abaixo mostra a frequência de palavras-chave escolhidas pelos autores deste relatório com base no estatuto da Frente e no discurso proferido na cerimônia de inauguração. A lista de palavras foi criada com base nas mais mencionadas no discurso (das quais fizemos a primeira seleção das mais relevantes de acordo com os temas do relatório) e na leitura do estatuto da Frente. Como resultado final (Gráfico 3), é possível identificar alguns elementos-chave que endossam a compreensão e visão dos deputados sobre a doutrinação nas escolas. 

 

Gráfico 3: Frequência de Palavras-Chave no Discurso de Posse

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Fonte: YouTube | Elaboração: Democracy Reporting International 

 

  • Ao analisar o discurso de Gustavo Gayer (PL-GO), líder da Frente durante a cerimônia, é possível compreender algumas das preocupações que motivaram os deputados a criar esse instrumento na Câmara. Ele afirma que, como professor, começou a perceber que "o sistema educacional foi sequestrado por uma ideologia e transformado em uma máquina para produzir ativistas incapazes de pensar por si mesmos, que apenas regurgitam mantras que são enfiados goela abaixo e são ensinados a odiar seus pais”. 

 

  • Além disso, Gayer afirma que a doutrinação ideológica nas escolas é "muito mais séria do que apenas a alienação da próxima geração. É a destruição das famílias. O número de famílias que vi desfeitas, pais e mães chorando desesperadamente, como se tivessem perdido seus filhos para o crime, para as drogas. Porque a criança começa a odiar o pai, a odiar a mãe, e todos os valores que os pais defendem. ” 

 

  • Durante seu discurso, ele argumenta que a doutrinação pode ser vista como "violência ideológica" e, além disso, relaciona essa ideia de doutrinação a diferentes tópicos, como "ideologia de gênero", associando-a diretamente a crimes violentos: “Acredito que é por causa dessa violência ideológica que temos pessoas que defendem o assassinato de crianças, que apoiam a ideologia de gênero.”

 

  • Como pudemos ver no Gráfico 3, a palavra-chave mais mencionada é "professor". Ao longo da cerimônia, a Frente se refere aos professores como a principal fonte de doutrinação e ideias "pervertidas" para corromper as crianças. A linguagem é acusatória e coloca os professores como alvo: "[...] há militantes se passando por professores, e nem mesmo pode-se chamar essas pessoas de professores, são militantes disfarçados de professores que usam a profissão mais nobre que existe para destruir famílias, destruir uma sociedade e arruinar a mente e o coração das crianças". 

 

  • Em relação às palavras “crianças” e “pais”, duas ideias principais são apresentadas durante a cerimônia: eles estão criando essa frente para proteger as crianças e restaurar a autoridade que os pais deveriam ter sobre a educação de seus filhos. Gayer argumenta: "qual é a prerrogativa inicial da frente? Vamos devolver o poder aos pais e às famílias. Imagine um Brasil inteiro onde os professores voltem a respeitar os pais novamente [...] esta Frente é para os pais, para as famílias trabalharem para proteger nossas crianças". 

 

  • Em outro exemplo, Gayer fez uma afirmação ousada de que, como resultado da doutrinação, as escolas estão se tornando cada vez mais militantes em sua ideologia no Brasil: "você vai a uma universidade federal hoje, 90% dos alunos apoiam o Hamas"." 
  1. O que é dito: Compreendendo a doutrinação por meio dos tópicos comuns encontrados nas postagens do Instagram dos Signatários 

 

Esta seção analisa quais tópicos estão associados à "doutrinação" com base na presença dos deputados no Instagram. Para isso, dividimos esta seção em duas partes: (i) os políticos líderes no número de postagens sobre o tema e (ii) os principais tópicos encontrados com nossa metodologia de análise de tópicos. 

 

Políticos líderes no número de postagens e engajamento 

 

  • O gráfico abaixo mostra o número total de postagens para cada um dos dez políticos mais ativos no conjunto de dados filtrados, exibindo o engajamento médio - ou seja, o total de curtidas mais o total de comentários - por postagem no Instagram. 

 

Gráfico 4: Principais Políticos em Número de Postagens e Engajamento



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Fonte: Instagram | Elaboração: Democracy Reporting International 

 

  • O Deputado Capitão Alden (PL-BA) publicou sobre “doutrinação” mais de duas vezes em comparação aos outros membros de nossa amostra. No entanto, o conteúdo de Alden recebeu relativamente poucas interações (em média 3615 curtidas e comentários por postagem). Muitas de suas postagens também associam a crescente visibilidade da comunidade LGBTQIA+ a uma agenda comunista: "Infelizmente, desde cedo, muitas crianças são alvo de militantes de esquerda (especialmente professores, jornalistas, influenciadores digitais). O resultado: eles se tornam desviados perturbados desde cedo." "É melhor as crianças aprenderem a ser cidadãos patriotas do que se tornarem militantes comunistas alienados!". 

 

  • Em contraste, os Deputados Carla Zambelli (PL-SP) e Mario Frias (PL-SP) postaram sobre a doutrinação com menos frequência (50 e 27 vezes, respectivamente), mas receberam um engajamento médio muito mais alto por postagem no Instagram (mais de 35.000 interações cada). 

 

Tópicos comuns encontrados em postagens relacionadas à doutrinação

 

  • O gráfico abaixo apresenta os principais tópicos encontrados nas postagens analisadas. A modelagem de tópicos nesta seção é uma técnica que permite a identificação e extração de tópicos significativos a partir de um grande conjunto de dados não estruturados, como postagens em redes sociais. 
  • Dentro das postagens relacionadas à doutrinação, encontramos quatro tópicos principais: (i) Alegações de Doutrinação Político-ideológica de Esquerda; (ii) Alegações de "Ideologia de Gênero" e Doutrinação LGBTQIA+; (iii) Alegações de Doutrinação na Mídia; e (iv) Alegações de Doutrinação nas Escolas. Analisamos cada tópico abaixo para compreender sobre quais assuntos eles discutem ao abordar cada tema. 

Gráfico 5: Principais Tópicos Encontrados em Postagens sobre Doutrinação 

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Alegações de doutrinação político-ideológica de esquerda

 

Do conjunto de postagens relacionadas à doutrinação, o maior tema foi o uso de linguagem agressiva contra ideologias políticas opostas, especificamente o comunismo. A nuvem de palavras abaixo indicaos adjetivos mais frequentes nas postagens do Instagram dos deputados. 

Gráfico 6: Adjetivos Mais Frequentes em Postagens sobre Doutrinação

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Fonte: Instagram | Elaboração: Democracy Reporting International 

 

  • A palavra mais popular foi "comunista", aparecendo em 190 postagens no total. Também é notável a prevalência de termos como "esquerdista", "militante" e "gênero". 

 

  • Nossa análise qualitativa do subconjunto sobre doutrinação revelou que os deputados signatários da Frente Parlamentar frequentemente descrevem o governo atual de Lula como comunista, utilizando de forma intercambiável os termos "esquerdista", "liberal", "socialista" e "comunista" para descrever políticas e ideologias com as quais discordam. Muitas postagens destacam abusos por governos comunistas ao longo da história e prometem desafiar a imposição de um governo semelhante no Brasil. "Não é uma 'teoria da conspiração', é uma realidade que ENFRENTAREMOS E COMBATEREMOS! Não vamos aceitar o comunismo se instalando no Brasil!", "Não permitiremos que o criminoso condenado [Lula] e seus comparsas transformem nosso país em outra potência comunista!", "Não é apenas uma coincidência, é a realidade. A ditadura comunista está aqui!". instagram

    Fonte: Instagram | Elaboração: Democracy Reporting International 

  • Em suas postagens, os deputados também criticaram os governos de esquerda e comunistas de países como Venezuela e Cuba, comparando as políticas desses países com as do governo de Lula. “O comunismo resulta em pobreza, uma verdade irrefutável. Este é o tipo de regime que Lula promove e que envergonha o Brasil no exterior. Maduro é um narco-ditador que afundou seu país na fome e na pobreza”. 

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Na postagem acima, o Dep. Sargento Gonçalves (PL-RN) comemora o golpe de Estado brasileiro de 1964.

Fonte: Instagram | Elaboração: Democracy Reporting International 

  • Muitos deputados acusaram o governo de Lula de tentar doutrinar a juventude do Brasil para aceitar suas políticas de esquerda. "Para a esquerda, não basta impedir os pais de educarem seus filhos. Eles precisam doutrinar seus filhos para que mudem a mente de seus pais. Se depender de Lula, nossos filhos serão militantes de esquerda em nossos próprios lares.", "A esquerda quer que as pessoas sejam desqualificadas para que todos dependam do estado". 

 

  • Observamos muitos deputados associando as políticas econômicas do governo Lula à doutrinação: "Eles estão nos enfiando ideologias e miséria pela goela! A esquerda está ‘fodendo’ as pessoas com inflação e impostos, enquanto sussurra em seus ouvidos: ‘é para o seu próprio bem’". 

 

  • Os deputados signatários também fizeram amplo uso da palavra "militante" ao descrever apoiadores de movimentos de esquerda, a imprensa ou até mesmo políticos. O uso desse termo associa um senso de ameaça física àqueles percebidos como promotores de doutrinação, em vez de uma ameaça puramente ideológica. "Fanáticos de esquerda estão pressionando Lula a nomear uma mulher negra (e militante, é claro) para a vaga de Rosa Weber... Eles querem transformar o Supremo Tribunal em uma espécie de diretório do PSOL!" "O jornalismo militante não pode mais nos manipular e os VILÕES não serão transformados em mocinhos!". 
  • Alegações de "Ideologia de Gênero" e LGBTQIA+ como doutrinação

     

    Também proeminentes entre os tópicos relacionados à doutrinação estavam questões em torno da ideologia de gênero e da comunidade LGBTQIA+. As postagens dos deputados não apenas expressaram oposição esmagadora à crescente visibilidade de pessoas LGBTQIA na sociedade brasileira, mas também associaram essa visibilidade a uma agenda sinistra para corromper a juventude do país. 

  • De particular preocupação entre os deputados signatários estava a legalidade da cirurgia de redesignação sexual para menores. Mario Frias (PL-SP) postou o conteúdo relacionado à doutrinação que recebeu mais interações, onde o Deputado expressou gratidão pelo compromisso declarado de Elon Musk em financiar esforços para proibir a cirurgia de transição em menores. A postagem recebeu mais de 218.000 curtidas e 7.300 comentários. 

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Fonte: Instagram | Elaboração: Democracy Reporting International

 

  • Vários políticos também descreveram os esforços de grupos LGBTQIA+ para promover uma linguagem inclusiva e neutra em relação ao gênero como uma forma de doutrinação: “[Linguagem neutra] é apenas a destruição ideológica de nossa língua. Uma imposição ideológica artificial sem valor real de comunicação.”, “Não podemos permitir que a ideologia de gênero nos seja imposta unilateralmente e contra nossa Constituição Federal”. 

 

  • Mais do que qualquer outro tema, ao discutir questões de gênero e LGBT, os deputados signatários disseminaram desinformação prejudicial para apoiar a narrativa de que a ideologia de gênero e as identidades LGBTQIA+ estão sendo "forçadas" de maneira não orgânica para a juventude do Brasil. Associações da comunidade LGBTQIA+ com pedofilia e satanismo foram frequentemente observadas. “Devemos proteger nossas crianças do ativismo satânico que quer destruir a infância. Isso não é uma luta por inclusão e aceitação, isso é uma apologia à pedofilia e à doutrinação ideológica.”. 

 

  • Algumas postagens nem sequer mencionaram exemplos do Brasil, mas sim dos Estados Unidos. No exemplo abaixo, o texto da imagem pode ser traduzido como: 'Estamos indo atrás dos seus filhos', cantam ativistas em um comício LGBT+ nos EUA. Durante a Marcha Drag em Tompkins Square Park, Nova York, ativistas LGBT+ cantaram trechos de uma música controversa nos Estados Unidos. "Estamos aqui, somos gays, estamos indo atrás dos seus filhos", entoaram membros da comunidade na sexta-feira, 23. O clipe foi retirado do contexto e apresenta um canto satírico pelos manifestantes, zombando da ideia de que a comunidade LGBTQIA está deliberadamente corrompendo crianças. 

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Fonte: Instagram | Elaboração: Democracy Reporting International

 

 

  • Em um esforço para aplicar penalidades criminais à doutrinação de crianças, vários deputados definiram o ensino da "ideologia de gênero" como "desvalorização ou discriminação do sexo biológico; imposição de ideologia sobre a existência de um sexo biológico neutro; imposição de ideologia para a inversão do sexo biológico." 

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Fonte: Instagram | Elaboração: Democracy Reporting International

 

Alegações de doutrinação nas escolas

 

  • Muitas das postagens relacionadas à doutrinação não se referiram a currículos escolares específicos ou políticas do governo Lula, mas expressaram oposição a grandes movimentos culturais ou políticos, como o esquerdismo ou a conscientização LGBTQIA+. No entanto, os pesquisadores observaram alguns exemplos específicos: 

 

  • Tentativas de algumas escolas de implementar banheiros neutros em relação ao gênero e inclusivos para pessoas trans foram alvo de críticas por parte dos deputados. Em resposta à aprovação de uma lei que multaria "qualquer pessoa que negue, impeça, dificulte ou retarde o acesso de pessoas trans ou daqueles que não se identificam com seu sexo biológico a banheiros, vestiários", Capitão Alden postou: “A agenda 'acordada' busca promover agitação social, subvertendo valores e silenciando aqueles que se opõem a imposições ideológicas.” A resistência a tópicos que envolvem os direitos das pessoas trans já foi discutida em um relatório anterior do Projeto Mídia e Democracia. 

 

  • A decisão do governo Lula de fechar várias escolas civis-militares foi fortemente criticada por alguns deputados, que afirmaram que as verdadeiras escolas que precisavam ser fechadas eram aquelas que promoviam uma agenda de esquerda. “Enquanto o mundo do crime continua a crescer, o governo federal quer acabar com o Programa de Escolas Cívico-Militares criado sob a administração Bolsonaro. Isso faz parte de um plano de doutrinação destinado a alienar e doutrinar crianças a serviço dessa ideologia”. 

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Fonte: Instagram | Elaboração: Democracy Reporting International

 

  • Muitos deputados referenciaram casos isolados de comportamento inadequado ou percebido como inadequado nas escolas, mas escreveram sobre esses exemplos como se ilustrassem um esforço maior para doutrinar crianças em ideologias seculares, de esquerda e pró-LGBTQIA+. 

 

  • Em resposta a uma carta de um centro acadêmico de esquerda convidando novos alunos a se juntarem ao grupo, o Deputado Marcelo Álvaro Antônio (PL-MG) comentou: “Lamentável! Estudantes que deveriam se preocupar com o aprendizado estão infectados pelo marxismo e querem transformar a universidade pública em uma fábrica de militantes”.

 

  • Em resposta a um professor de escola pública que chamou Jesus de "vagabundo e idiota" em sala de aula, o Deputado Carlos Jordy (PL-RJ) declarou: "Esses são os tipos de professores que gritam que o Estado é secular e reivindicam o direito de doutrinar os filhos de outras pessoas com suas convicções ideológicas". 

 

  • O Deputado Luiz Lima (PL-RJ) referiu-se a uma tarefa de casa para alunos do ensino fundamental que desafiava os estudantes a examinar os papéis de gênero como um exemplo de doutrinação. "Este é apenas o começo da implementação da agenda progressista. Escolas que estão cada vez mais doutrinadoras, partidárias e voltadas apenas para treinar militantes. Isso vai se tornar insustentável. Precisamos parar esse tipo de ideologia e manipulação!". 

 

  • Alguns deputados também abraçaram desinformação e teorias conspiratórias para justificar a existência de uma agenda elitista com o objetivo de doutrinar e corromper crianças. Uma postagem do Deputado Maurício do Vôlei (PL-MG) afirma que "documentos vazados da WHO revelam plano de forçar crianças a terem parceiros sexuais" e que "as Nações Unidas, em colaboração com a Organização Mundial da Saúde e Rutgers, financiada por Bill Gates, lançaram a próxima fase de sua guerra contra a humanidade, sexualizando crianças pequenas no ensino fundamental ao redor do mundo, com o objetivo de normalizar a pedofilia." O documento, "Padrões para Educação Sexual na Europa", foi publicado pela WHO como uma tentativa de fornecer padrões adequados para a educação sexual em países europeus. 

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Fonte: Instagram | Elaboração: Democracy Reporting International

 

  • Em outras postagens, deputados fizeram afirmações contundentes de que as universidades no Brasil estão se tornando cada vez mais militantes em seus currículos, chegando ao ponto de acusar escolas de ensinarem ideologia pró-nazista. Os autores deste relatório não encontraram nenhuma prova que sustente tais alegações. 

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Fonte: Instagram | Elaboração: Democracy Reporting International

 

Alegações de doutrinação na mídia

 

  • O tema da doutrinação também foi frequentemente associado a ataques às instituições midiáticas. Muitas postagens abordaram a discussão que aconteceu no Brasil há alguns meses sobre uma potencial lei para regular plataformas de mídia digital, seguindo os esforços da União Europeia com o Digital Services Act. Um relatório anterior dentro do projeto cobriu as repercussões desse debate online. 
  • Acusações de que a "mídia mainstream" ou a "mídia militante" estavam em conluio com o governo Lula e eram cúmplices em promover uma agenda de doutrinação foram observadas. "A mídia mainstream está em silêncio! O silêncio é porque a esquerda acha que estupro e pedofilia são normais. Este é o desgoverno que administra o país!", "Eles estão obcecados em criar uma narrativa para condenar Bolsonaro e torná-lo inelegível!!! O PT tem apoio incondicional da mídia militante...", "Prioridades do desgoverno do PT: Recursos para países socialistas e a mídia mainstream militante...".

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Fonte: Instagram | Elaboração: Democracy Reporting International